Mas Stela Hershmann, que acompanha as negociações na conferência pelo Observatório do Clima, ressalta que de nada vai servir se o país continuar na trajetória atual de emissões, em alta devido aos novos recordes de devastação da Amazônia nos últimos anos.
“Esse potencial que é referenciado, com valores bilionários, existe porque o Brasil tem um potencial enorme de ser carbono neutro e cumprir muito além do que foi prometido. Mas, hoje, a gente se coloca numa posição de sermos compradores de créditos, e não vendedores”, destaca a especialista em negociações climáticas. “O Brasil está começando o período de entrada em vigor do Acordo de Paris se distanciando das suas metas.”
Representantes agrícolas, industriais e empresariais brasileiras marcam presença em Glasgow e estão atentos aos avanços no Artigo 6° do Acordo de Paris, que trata sobre o assunto.
Nelson Ananias Filho, especialista em georreferenciamento e coordenador de sustentabilidade da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), diz que a entidade é favorável a um acordo que inclua o setor privado (mercado voluntário).
“A gente – produtores rurais, CNA, CNI e outras instituições, principalmente do agro, que têm um potencial muito grande através do cumprimento do Código Florestal, do Agricultura de Baixo Carbono (ABC) e do potencial que o Brasil tem de certificar o seu carbono, queremos garantir que poderemos colocá-lo para vender no mercado. Para que a gente ajude o país a alcançar as suas NDCs (Contribuição Nacionalmente Determinada), mas também que seja atendido no mercado voluntário, em que poderá vender esse carbono para o mundo inteiro, para que todos possam atingir as suas metas, tanto de países, quanto de empresas privadas”, explica.
Pontos delicados
Por enquanto, são as regras mais gerais sobre as transações que estão sendo debatidas entre os 195 países. O detalhamento do funcionamento do futuro mercado e a sua implementação efetiva não devem ocorrer tão cedo.
“Uma das discussões é se você vai poder trazer créditos do antigo Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, da época do Protocolo de Kyoto. O Brasil é um dos maiores defensores desse carregamento de créditos, que sempre teve forte resistência por parte de outros países”, afirma Hershmann.
Outro aspecto delicado é dos chamados ajustes correspondentes.
“Por exemplo: se o Brasil faz um projeto de redução de emissões e vende esse crédito para um outro país, esse comprador com certeza vai querer utilizá-lo para contabilizar na sua NDC, o seu compromisso climático. O país que está vendendo também não pode contabilizar para si essa redução na atmosfera. Ou seja, temos de ter muito cuidado na construção dessas regras, para evitar uma dupla contagem”, frisa a especialista do Observatório do Clima.
Ela percebe que, diferentemente da última COP, em 2019, quando o mercado de carbono foi um dos pontos que travaram as negociações, desta vez os países parecem mais dispostos a ceder, em nome de um consenso. Brasília já revelou que vai à Escócia com uma postura mais “construtiva” e não pretende “bloquear nada”.