Quarta-feira, 16 de julho de 2025
Por Redação do Jornal O Sul | 3 de fevereiro de 2024
Cinco ministérios concentraram mais da metade dos recursos do Orçamento empoçados em 2023, segundo dados do Tesouro Nacional. O fenômeno ocorre quando o governo libera recursos para os ministérios e órgãos públicos, mas, por razões diversas, eles não conseguem gastar o dinheiro, ficando o montante parado no caixa e, ao fim do exercício, sendo incorporado ao resultado primário da União.
Em valores absolutos, o empoçamento foi maior na Saúde (R$ 6,6 bilhões), Cidades (R$ 2,2 bilhões), Educação (R$ 1,6 bilhão), Transportes (R$ 1,6 bilhão) e Desenvolvimento Regional (R$ 1 bilhão). Juntos, esses cinco ministérios responderam por R$ 13,1 bilhões dos recursos não utilizados no ano passado, ou 65,9% do valor total.
Em 2023, o empoçamento total foi de R$ 19,8 bilhões, o equivalente a 3,7% do limite de pagamento liberado a todos os ministérios. Desse total, R$ 1,8 bilhão era de recursos vindos de emendas impositivas (individuais e de bancada) e R$ 927,8 milhões de emendas de comissão do Congresso Nacional.
Proporcionalmente ao limite de pagamento autorizado pelo Tesouro, os ministérios campeões de empoçamento foram Pesca e Aquicultura (81,2% do valor liberado para a pasta ficou empoçado), Igualdade Racial (71,8%) e Mulheres (52,6%), todas pastas criadas pelo governo no ano passado. A economista Vilma Pinto, diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão de monitoramento das contas públicas ligado ao Senado Federal, afirma que é comum em ministérios novos o nível alto de empoçamento, devido à demora no processo de estruturação das políticas públicas e da própria gestão orçamentária da pasta.
Os dados começaram a ser destacados pelo Tesouro Nacional a partir de 2017. São valores que preocupam a gestão pública, porque a Constituição prevê que a administração pública tem o dever de executar as programações orçamentárias, mas o que tem-se observado nos últimos anos é uma média anual em torno de R$ 20 bilhões de recursos liberados, mas não utilizados.
Pela definição técnica, o empoçamento se refere à diferença entre os pagamentos efetuados e o limite autorizado a cada ministério ou órgão público. A utilização desse limite não depende da gestão financeira do Tesouro Nacional, mas sim de cada pasta.
Técnicos do governo costumam atribuir à rigidez alocativa (mínimos constitucionais de saúde e educação, vinculações e outras despesas obrigatórias, como emendas impositivas) a explicação para grande parte do empoçamento. Especialistas em gestão pública também acrescentam como motivo a falta de projetos estruturados e também de planejamento de gastos das áreas.
Vilma Pinto lembra que, em 2023, as liberações dos limites financeiros para gastos foram menores no começo do ano e maiores nos últimos dois bimestres, o que pode ter contribuído para a dificuldade das pastas em gastar o recurso.
Ela acrescenta que o governo contava no início do ano passado com um empoçamento da ordem de R$ 25 bilhões para reduzir o déficit, porque considerava que, com a PEC da Transição, o Orçamento havia sido ampliado significativamente, e nem todos os ministérios conseguiriam usar mesmo o dinheiro.
O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, destacou que os ministérios fizeram um esforço grande em dezembro para executar os recursos liberados. “Em novembro [o empoçamento] tinha ficado em R$ 34 bilhões e houve um esforço das áreas para utilização desses saldos financeiros disponíveis”, afirmou em entrevista.
Pinto explica que, realmente, o empoçamento é um problema crônico há anos. Ela afirma que um decreto de programação financeira feito de forma mais linear pode ajudar a reduzir os valores empoçados, assim como uma dinâmica melhor de planejamento de gasto por cada um dos órgãos e uma revisão das vinculações orçamentárias.
Se por um lado o empoçamento é ruim para a gestão orçamentária, por outro ajuda o governo a melhorar o seu resultado primário. Isso porque os valores que ficam parados no caixa dos ministérios ao fim do ano acabam sendo incorporados pelo Tesouro ao resultado primário da União, ajudando a reduzir o déficit ou melhorar o superávit. Em 2023, o déficit do governo central foi de R$ 230,5 bilhões (valor que considera o pagamento extraordinário de precatórios), mas, se não fosse o empoçamento de R$ 19,8 bilhões, o rombo teria sido ainda maior, de R$ 250,3 bilhões.
Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que “apenas 0,3%” dos recursos da pasta “não foram empenhados”. O Ministério da Igualdade Racial também não respondeu sobre os dados de empoçamento, mas sim sobre dotação orçamentária anual, que fechou 2023 com 99,98% executados. Já o Ministério do Desenvolvimento Regional disse em nota que grande parte dos recursos orçamentários do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR) é destinada à realização de obras de médio e grande porte, e suas execuções tendem a ultrapassar mais de um exercício.