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Por Redação Rádio Pampa | 21 de junho de 2023
Passados quase seis meses do 8 de janeiro, o Alto-Comando do Exército continua enredado numa trama da qual afirma, dia sim, outro também, não ter participado institucionalmente – de um plano para dar um golpe, impedindo a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A suspeita, contudo, corrói sua imagem e envolve, sem trégua, seus oficiais.
“Nós, o Exército, nunca quisemos dar nenhum golpe. Tanto não quisemos, que não demos. Não houve uma única unidade sublevada”, disse o chefe do Estado-Maior da Força Terrestre, general Fernando José Sant’Ana Soares e Silva, segundo homem na linha de comando. “As Forças Armadas não se envolveram em atos golpistas. Muitos militares da reserva podem ter atuado nesse ou naquele sentido. Entretanto, nós, não”, insistiu o general.
O Estado-Maior, segundo o Exército, é responsável por “estudar, planejar, orientar, coordenar e controlar, no nível de direção-geral, as atividades da Força”, em conformidade com as decisões e diretrizes do comandante. O chefe do Estado-Maior integra o Alto-Comando, que reúne o comandante e outros 15 generais da ativa de quatro estrelas – o topo da hierarquia.
A política tomou conta da Força nos últimos anos, admitem oficiais. “Fomos totalmente capturados pelos assuntos políticos. Tragados pela percepção do golpismo”, avaliou o chefe do Estado-Maior do Exército.
Setores da população, da política e do establishment intelectual que compartilham a ideia de que a Força nunca perdeu a ambição política, destacou o general Soares, não aceitam a ideia de que o Exército é “apartidário e apolítico” e, por mais esforços que sejam feitos, esses conceitos continuam caindo no vazio.
Redes
“As redes sociais são muito atuantes e se perde uma energia infinita tentando desmentir ou separar o que é verdade das fake news”, disse ele.
Não que o Exército, prosseguiu o general, não tenha o que dizer e mostrar à sociedade.
Militares atuaram e atuam no auxílio aos yanomamis e a outras tribos na Amazônia e no combate ao garimpo. Além disso, projetos para a indústria de defesa – definida agora como um dos setores primordiais para a reindustrialização – seguem em discussão e outros tantos programas estão em marcha. Mas caem no vazio.
O problema número um é que não caem no esquecimento facilmente os quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL), no qual militares da ativa e da reserva participaram da administração e silenciaram diante das ameaças golpistas e de intervenção armada feitas quase que todos os dias pelo comandante em chefe.
O segundo problema é pouca gente, tida como minoritária e radical, que não parece esquecer que, em algum momento – ainda que estivesse completamente equivocada –, se viu próxima a tomar o poder, embora em nenhum momento o Alto-Comando tivesse feito qualquer sinalização de que poderia aderir a uma “maluquice” desse tipo.
Foi com esse espírito que marcharam na Esplanada e participaram dos atos de vandalismo e tentativa de golpe em 8 de janeiro. E que acamparam na frente de quartéis, desafiando a Constituição e pedindo intervenção militar.
Roteiro
Foi ainda esse mesmo espírito que a Polícia Federal encontrou nas trocas de mensagens entre o então ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, e oficiais como o coronel Jean Lawand Junior, com quem dividia planos de golpes.
“Não haverá como mudar a imagem da Força se nós, dentro, continuarmos a nos dividir. Se esses companheiros não entenderem que a única condição viável é a da democracia. Que nós não temos o direito de usar o Exército para atividades que contrariem nossa função precípua estabelecida na Constituição”, disse o chefe do Estado-Maior.
Na semana passada, o Exército barrou a transferência de Lawand Junior para um cargo nos Estados Unidos. O comandante da Força, general Tomás Paiva, determinou que ele ficasse no País para responder aos inquéritos do 8 de janeiro. Na ocasião, Lula se disse preocupado com a institucionalidade das Forças Armadas.
Cid está preso por suspeita de fraudar cartões de vacina contra a covid. Como mostrou o Estadão, o Código Penal Militar (CPM) e a Constituição projetam a expulsão do tenente-coronel do Exército.