Terça-feira, 30 de abril de 2024

Grandes empresas que atuam no Brasil são processadas no exterior por crimes ambientais

Adaptar as empresas às questões ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês), além de uma demanda da comunidade e de investidores, tornou-se uma necessidade em razão do risco legal às empresas globalizadas.

O motivo é a tendência de cortes da Europa e dos Estados Unidos de reconhecer a jurisdição daqueles países para julgar ações coletivas em razão de danos ambientais e sociais ou desastres provocados ao redor do mundo por empresas que têm sede, operações ou cujos controladores moram naqueles países. Trata-se de processos bilionários, um mercado que movimenta, por ano, cerca de US$ 40 bilhões.

Ele atrai fundos de investimento interessados em bancar causas de pessoas como o mecânico Mauro Marcos da Silva, de 53 anos, morador de Mariana, (MG), que teve uma propriedade de 2.148 m² destruída em 5 de novembro de 2015, com o rompimento da barragem de Fundão. Os 45 milhões de m³ de rejeitos de ferro despejados pela mineradora Samarco na bacia do Rio Doce causaram o maior desastre ambiental da história do País.

O mecânico é uma das 200 mil pessoas representadas pelo escritório de advocacia inglês PGMBM, que recentemente recebeu 100 milhões de libras (o equivalente a R$ 623,5 milhões) do fundo North Wall Capital para promover ações em nomes de consumidores vítimas de injustiças que não têm recursos para processar corporações. No caso de Mariana, o escritório contou com o financiamento de um fundo brasileiro, o Prisma Capital, que tem ativos alternativos de R$ 13 bilhões sob sua gestão. No PGMBM nenhuma ação desse tipo custa menos de 1 milhão de libras (R$ 6,2 milhões).

“O financiamento de litígios viabiliza o acesso à justiça e equilibra as forças em uma disputa”, disse João Mendes, sócio e diretor executivo da Prisma. Com o dinheiro do fundo, os advogados puderam entrar com a ação contra a mineradora BHP Billiton, uma das controladoras da Samarco, em Londres, cujo Tribunal de Apelação reconheceu, em 8 de agosto, a jurisdição inglesa para decidir a disputa que envolve de 5 bilhões a 7 bilhões de libras – em caso de vitória, o fundo recebe parte da soma.

As mineradoras envolvidas no caso apontam para uma estratégia agressiva do PGMBM e captação de clientes, com promessas de uma vitória fácil sem que nenhum das vítimas precise desembolsar um tostão para entrar com a ação em Londres, em troca de 30% do valor da indenização.

A BHP Billiton alegou que a ação constitui duplicidade de feitos, pois os fatos tratados na Inglaterra já estão sendo tratados pela Justiça no Brasil. Ela afirmou que já desembolsou bilhões de reais em reparações por meio da Fundação Renova e informou que estuda recorrer à Suprema Corte inglesa.

Maceió e Pará

Além do caso em Londres, ainda neste ano, a Justiça europeia vai decidir se tem jurisdição para analisar dois outros casos acontecidos no Brasil e levados para lá pelo PGMBM – ambos estão na Holanda. O primeiro envolve a Braskem. Em 21 de setembro, a Corte Distrital de Roterdã vai definir se o país tem jurisdição sobre os danos causados pela mineração de sal-gema em Maceió, em Alagoas.

Desde 1976, a Salgema Indústrias Químicas extraía ali sal-gema para produzir cloro e soda cáustica. Em 2002, a união dela com outras empresas do setor deu origem à Braskem. Em 2018, um abalo sísmico na região deixou rachaduras em imóveis e abriu crateras em ruas de diversos bairros da cidade, forçando cerca de 55 mil pessoas a deixar seus imóveis. O terremoto teria sido causado pelo deslocamento do subsolo em razão da mineração, o que levou a Braskem a encerrar a extração do sal-gema em Maceió, em 2019.

O outro caso que será analisado na Holanda envolve a Norsk Hydro. A gigante do alumínio norueguesa é acusada de danos materiais e morais causados pela degradação da floresta amazônica e pela contaminação da água com metais pesados e outros agentes em razão da produção de alumínio, em Barcarena (PA). Os atingidos seriam a população ribeirinha e comunidades indígenas e quilombolas, afetadas pelo lançamento de mercúrio, chumbo e arsênico no meio ambiente.

A ação é uma parceria do PGMBM com os advogados holandês Lemstra van der Kort e com o brasileiro Ismael Morais. “Não temos o total de pessoas atingidas, mas os associados são 11 mil, o que deve dar cerca de 40 mil pessoas, somados associados e seus dependentes”, afirmou Morais.

O valor da causa na Europa ainda não foi fixado, mas ele deve alcançar centenas de milhões de euros. Segundo Morais, o objeto da ação são dez despejos feitos pela empresa no meio ambiente e os danos morais que as pessoas sofreram. “Não houve acidente. O despejo foi doloso, calculado, e isso foi confirmado quando foram flagrados canais clandestinos e galerias inteiras para a derrama, inclusive no Rio Pará, dos efluentes da indústria.”

No Brasil, existem outras duas ações contra a empresa. Em uma delas, a Justiça determinou que a Norsk Hydro pagasse o exame de sangue em 300 pessoas supostamente afetadas pelos resíduos tóxicos lançados no meio ambiente pela empresa.

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