Terça-feira, 03 de dezembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 5 de abril de 2022
Em poucos dias, a bancada do PTB saltou dos 26 deputados eleitos para 43. Era o começo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, e as negociações no Congresso inflavam o partido de Roberto Jefferson, que decidira aderir ao novo governo. O movimento chegou ao seu ponto mais alto em 31 de janeiro de 2003, quando 30 parlamentares mudaram de legenda em um único dia, um recorde só superado pela data da criação do PSD, quando 51 deputados migraram para a nova casa.
Naquele 2003, com a abertura da primeira legislatura deste século, outro partido começou a inchar. O PL de Valdemar Costa Neto era beneficiado pela chegada de novos adeptos dispostos a apoiar Lula. O partido terminaria o período com 15 deputados a mais, fenômeno que se repetiria em intensidade muito maior agora.
Após receber a adesão do presidente da República, Jair Bolsonaro, a agremiação deixou a janela partidária de 2022 com um saldo positivo de 35 deputados – perdeu 15 e recebeu 50. Sua bancada eleita, de 33 parlamentares, foi a 74, segundo dados até a última sexta (1º) da Câmara dos Deputados. Um número que, segundo o vice-líder da bancada, Capitão Augusto (PL-SP), deve crescer e chegar a 77.
A história das mudanças partidárias nas cinco legislaturas deste século mostra que não é apenas a sobrevivência de partidos e de políticos que conta na hora de um deputado romper os laços com a legenda que o elegeu. O governismo e a busca por agremiações amorfas ideologicamente também são componentes das mudança. E, desta vez, na janela partidária de 2022, isso não foi diferente.
“Quanto mais ideológico o partido, mais difícil é a mudança. Quando eles são amorfos do ponto de vista ideológico, a mudança fica mais fácil”, afirmou o cientista político Carlos Pereira.
Total
Os dados mostram que, ao todo, houve 1.043 trocas de legenda no período, ou uma alteração a cada 6,7 dias. É como se toda semana um parlamentar mudasse de agremiação. O número inclui os casos em que o parlamentar ficou sem partido e os casos de deputados que trocaram de legenda mais de uma vez em uma mesma legislatura.
Os partidos do Centrão foram os principais beneficiados. Além deles, lucraram as novas legendas – quando a legislação permitia aos deputados levar tempo de TV e recursos do Fundo Partidário para a nova agremiação e as regras para a fusão de legendas eram menos restritivas.
Para Pereira, os números demonstram que esses partidos são satélites de qualquer governo e maximizam os ganhos em qualquer coalizão governante. “Raramente lançam candidatos à Presidência ou são partidos do presidente, a não ser agora, quando o presidente faz a migração”, disse o professor.
A trajetória do PL/PR neste século é singular. Primeiro, a legenda abrigou José Alencar, vice-presidente de Lula. O partido elegeu 26 deputados em outubro de 2002, mas, já no momento da posse, em 2003, contava com 33 parlamentares. Chegou a ter 46 e terminou o primeiro mandato de Lula com 37, após Costa Neto renunciar ao mandato de deputado em razão do escândalo do mensalão. Na atual legislatura, novamente a proximidade com o poder favoreceu a sigla.
Além de o próprio presidente ter migrado para a sigla, o PL aproveitou outra característica marcante das trocas desta janela partidária: o componente ideológico. Quase todos os integrantes da tropa de choque bolsonarista da Câmara acompanharam o presidente. Deixaram o União Brasil, partido nascido da fusão entre o DEM e o PSL, e foram para o PL. Para lá migrou um número expressivo de integrantes da bancada da bala, principalmente militares eleitos em 2022.
Incompatível
O movimento dos bolsonaristas provocou reações dentro do PL. O deputado Marcelo Ramos (AM), vice-presidente da Câmara, foi um dos que deixaram a legenda por incompatibilidade com Bolsonaro e seus apoiadores.
“Não me permito participar de qualquer projeto que ponha em risco a democracia. Defendo a democracia e abomino a tortura. E, por isso, seria incompatível ser do partido de um presidente que repudio”, afirmou Ramos.
Em seu primeiro mandato na Casa, Ramos se destacou pelo diálogo com todos os partidos. Sua saída do PL ocorreu antes da janela partidária. “Fui o primeiro a saber que o Bolsonaro ia entrar no PL. O Valdemar me telefonou. Ele foi muito correto comigo.”
O deputado obteve ainda uma decisão favorável do então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, para a mudança. É que, desde 2007, o Supremo Tribunal Federal considera que o mandato do deputado federal – eleito em votação proporcional – pertence ao partido, e não ao parlamentar. Assim, a troca de legenda sem justa causa pode levar à perda do mandato, desde que ela seja pedida pela direção partidária.